Ontem percorri a velha estrada entre Guimarães e Ribeira de Pena. Tantas vezes a fiz por não ter outra alternativa, ontem foi por mero prazer ao som de
Dulce Pontes e Ennio Morricone. Esteja o tempo que estiver, é um percurso fantástico para viver emoções numa viagem onde a pressa não tem lugar. E ao invés de atravessar as Terras de Basto pelo alto das suas serras, penetrei pelo seu interior profundo, dando-me novamente conta da sua identidade e da sua ruralidade plena de imagens inesquecíveis, que convosco partilho. Aqui, estamos num mundo cuja evolução é lenta, mas que continua com a sua identidade bem marcada. Do alto da Gandarela, visualizo a Sul o vale do Tâmega, onde se alojam Mondim e Celorico, envolto pelas colinas do Marão e do Alvão hoje repletas de aerogeradodes que à noite lhes dão um ar mágico com suas pequenas luzes intermitentes. Ao centro e quase isolado, o Alto da Senhora da Graça permanece imponente, qual atalaia vigilante sobre todo o vale. Tempos houve em que a locomotiva subia o Tâmega até ao Arco; tempos houve em que o Castelo de Arnóia vigiava todo este vale. Hoje, à noite, todo o vale é iluminado sem excesso dando-lhe um ar belo. Mais à frente, e olhando agora a Norte, vislumbro o vale de Cabeceiras, envolto pelas colinas da Cabreira. Tempos houve também em que o Mosteiro de S. Miguel dominou toda esta área. Passamos o Arco de Baúlhe, centro indiscutível de toda a Região de Basto. Seguimos pelo Ribeiro do Arco onde o Alto de Formoselos, posto avançado do Alvão, se deixa vislumbrar de perto e nos anuncia os contrafortes desta Serra e, com eles, a entrada em Trás-os Montes. Depois vem Cavez e a sua Ponte sobre o Tâmega, que desde tempos remotos serve de ligação privilegiada entre o Minho e Trás-os Montes... e de divisão. Aqui Camilo conheceu as belas mulheres serranas possuídas por demónios e assistiu às escaramuças entre os "
barões feudais a cujas barbacãs não chegavam as justiças d'el Rei" vindos dos dois lados desta "fronteira". Entra-se em Trás-os Montes com a sensação de não ter saído do Minho; continuam as antigas e belas casas senhorias, o povoamento disperso, o vinho verde... Começa a subida para as altas terras transmontanas, mas lentamente. Então, uma outra face do vale do Tâmega aparece, agora vindo de Espanha aos socalcos por entre as encostas do Alvão, do Barroso e da Cabreira. E banhada pelas suas águas, encostada ao Alvão, Ribeira de Pena, a última terra de Basto, a primeira transmontana, numa harmoniosa combinação entre o Vale e a Serra. Aconselho quem tiver oportunidade a fazer este trajecto; e no fim, podem-se ficar por aqui ou então subir o Alvão e entrar num mundo diferente pela terra fria transmontana.